quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Feriado

A brasa consumia o cigarro entrelaçado aos dedos destros enquanto ele exibia um riso antipático para a cidade, debruçado sobre o parapeito da janela da sala. Olhou as janelas que o circundavam, ninguém o espiava. Despejou as cinzas no jardim, sem culpa, e levou o cigarro à boca. Tragou.
A cidade estava estranhamente desinteressante. Observava e quase não podia constatar animação nas ruas. O céu que aparecia por entre os prédios, aquele e os vizinhos, era cinzento. Parecia um reflexo sem graça do asfalto.
Cuspiu a fumaça.
Procurou alguma coisa nova naquilo tudo, porque a vista já havia cansado. Nada.
Entendeu, por fim, que a tarde lá fora não era diferente daquela que transcorrera, até então, ali dentro. O silêncio e a languidez eram nele, o tempo todo.
Sentiu o cheiro da fumaça do cigarro. Lembrou-o e tragou.
Depois apagou o cigarro e o atirou no jardim. Cuspiu mais uma vez a fumaça. Olhou em volta com a mesma pressa daquele que se despede de um afeto, mas não havia afeto, então fechou a cortina e largou-se ao sofá.

***

Ultimo post de 2009 \o/
Que animação pra fechar o ano. Uhul
Dois mil e nove vai tarde, R.I.P, e dois mil e dez vai começar bem.
Três dias de prova na primeira semana. Bacana.
Mas a prova passará.


Que 2009 termine bem para vocês e comece melhor ainda o ano de 2010.
Muito obrigado a quem pasou por aqui e sintam-se convidados a voltar.
Tudo de bom, galera.

Torçam por mim na Fuvest
e assistam ao filme 'Minha vida sem mim'

Beijos

Feliz 2010 para nós todos!
\o/

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

"Minha vida sem mim"

Um post que vale a pena.

Neste post falarei do meu dia de Natal, sendo desimportante exceto por ter sido o dia que eu me reencontrei com meu filme favorito, o "Minha vida sem mim" (My life without me -Canadá/Espanha, 2003), que estava perdido na casa da minha avó.

Este filme não é aquele que mais combina com o dia de Natal, mas não importa, é sempre uma experiência agradável para mim assisti-lo novamente. É, eu já o assisti mais de seis, sete vezes (chutando baixo) e em cada vez consigo perceber uma sutileza nova que faz o filme ainda mais especial.

O que mais gosto nele é a forma com que são desenvolvidos diversos conflitos em torno de um principal. O filme, em resumo, faz a gente refletir a respeito da rotina e de como nela certas coisas passam desapercebidas.
Se eu falar mais sobre o filme ou colocar uma sinopse aqui, ele vai ficar com cara de clichê. O tema até dá a entender isso, mas o filme vai muito além.

Aqui vai o texto inicial do filme. Só pra se ter idéia:

"Esta é você. Olhos fechados, na chuva. Você nunca pensou que estaria fazendo algo parecido com isso, nunca se viu como - eu não sei como descreveria... - como uma daquelas pessoas que gostam de olhar para a lua, que passam horas contemplando as ondas ou o pôr-do-Sol, ou... Acho que você sabe o tipo de pessoa que eu estou falando. Talvez você não. Enfim, você meio que gosta de estar assim, lutando contra o frio, sentindo a água penetrar através de sua camisa até a sua pele e a sensação do chão ficando fofo embaixo dos seus pés. E o cheiro... e o barulho da chuva batendo nas folhas. Todas as coisas que estão nos livros que você não leu. Esta é você, quem teria imaginado? Você."

Fica então a dica, coisa que eu nunca fiz antes no escape.


=D

ficha técnica:

  • título original: Mi Vida Sin Mi
  • gênero: Drama
  • duração: 01 hs 46 min
  • ano de lançamento: 2003
  • estúdio: El Deseo S.A. / My Life Productions Inc. Milestone Productions Inc. / SLU
  • destribuidora: Sony Pictures Classics / Warner Brothers / Imagem Filmes
  • direção: Isabel Coixet
  • roteiro: Isabel Coixet, baseado em livro de Nancy Kincaid
  • produção: Esther García e Gordon McLennan
  • música: Alfonso Vilallonga
  • fotografia: Jean-Claude Larrieu
  • direção de arte: Shelley Bottom
  • figurino: Katia Stano
  • edição: Lisa Robison

Assistam



PS.: Se for assistir, preste atenção nos detalhes mínimos como as taças de cristal, a lanchonete e o cheesecake, a faxina e todos os diálogos e reflexões. Vale muito a pena esse filme!


Outro PS: No post abaixo eu citei a música "Amor pra recomeçar" do frejat. Depois uma amiga minha, uma tal de Marina (... morena você se pintou? xD), me disse que a música havia sido inspirada no poema "Desejo", de Victor Hugo. Pois é, eu não sabia disso. Gostei muito do poema também e se vcê não o conhece, procure-o. A música é bem fiel ao poema, mas como a Mah e eu concluímos, "o poema tem mais coisinhas, por isso é mais legal".
É isso. Valeu, Mah, por ler o blog e pelo Victor Hugo.



quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Então, é Natal...

Podem pular a parte verde escura.

O Natal acontece todo ano, há mais de dois mil anos. Não tem como ser original, não é?

Bom, eu não quero falar do Natal, porque este Natal vai ser muito diferente do Natal passado. Como o Natal passado foi melhor que o retrasado, neste sentirei falta de algo, mas é Natal e não tem como fingir que não.

Paciência.


É, amanhã é Natal e eu estou indiferente a isso tudo. Eu passei pela Avenida Paulista todos os dias dessa semana, assisti aos corais de Natal, tudo para entrar no clima e não deu certo. Agora não tem jeito, acabou, o Natal está aí.

Geralmente as decorações e o espírito de Natal me conquistam e ganham a minha simpatia, e mesmo com muito esforço, dessa fez eu não me emocionei com os cânticos, nem com as luzes, nem com as alegrias das pessoas, nem em pensar naqueles que não têm ceia ou presentes, nada, enfim, me comoveu.


É, amanhã é Natal. Depois contaremos menos de uma semana até o fim do ano de 2009 que, para mim, está fazendo hora extra. E quanto mais ele demora a ir, mais tempo eu tenho de remoer todas as histórias que eu vivi no ano. É disso que eu não gosto.

As coisas boas deixaram uma saudade difícil de descrever. É uma saudade que traz junto um pesar e uma sensação de cansaço, horríveis. Já as lembranças ruins, essas eu gosto, porque nelas obtenho o meu perdão.


Bom, amanhã é Natal.

Quero, então, finalizar o post mais estúpido que já teve espaço neste blog (e olha que é só mais um) desejando a todos os leitores, amigos, visitantes e etc. um Feliz Natal, seja lá como for. Que nesta data possam refletir sobre coisas importantes de suas vidas, sejam de cunho particular, social, político... Como quiserem, reflitam! Reflitam sobre o amor!

Não deixem esta data passar em branco. Digo isto porque simboliza o Nascimento de Jesus, o maluco que, vendo uma multidão a hostilizá-lo, orou para que Deus os perdoasse.

Se você por algum motivo não acredita na história que acabei de mencionar, não quero mudar a seus conceitos religiosos, só quero mesmo é tentar fazer com que reflita sobre esse negócio de amar o próximo.

Não reflita somente no Natal, ele acontece apenas uma vez a cada ano, como disse no começo do texto, mas aproveitem o Natal principalmente para refletir. É pertinente e ajuda pra caramba.

Finalmente, quero deixar uma música (trecho), que ouvi de um dos corais da Paulista.

Eu te desejo
Não parar tão cedo
Pois toda idade tem
Prazer e medo...

E com os que erram
Feio e bastante
Que você consiga
Ser tolerante...

Quando você ficar triste
Que seja por um dia
E não o ano inteiro
E que você descubra
Que rir é bom
Mas que rir de tudo
É desespero...

Desejo!
Que você tenha a quem amar
E quando estiver bem cansado
Ainda, exista amor
Prá recomeçar
Prá recomeçar...

[...]

Eu desejo!
Que você ganhe dinheiro
Pois é preciso
Viver também
E que você diga a ele
Pelo menos uma vez
Quem é mesmo
O dono de quem...

(Amor pra recomeçar – Frejat)


PS: A parte mais clara tem mais coerência e mais relevância.

Sucesso e

** FELIZ NATAL**

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Segurança

Fechadas as portas, janelas e coração
É mais terno, mais quente
É mais seguro e controlável
É um abrigo à Luz e à canção
Surda e interna. Própria

Velo tudo à volta
Antes que esse tudo se vá
Fecho tudo e tranco aqui
Guardo cá
A tempestade e a paz
Minhas só

Ninguém mais

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Luzes

Eu fiquei entre duas luzes. Uma luz era a tal Luz branca, a outra, a Luz no fim do túnel. Foi patético.

Eu acordei e não sabia onde estava, nem para onde estava sendo levado, nem nada. Eu estava realmente perdido. Demorei ainda um pouco perceber o que tinha acontecido, mas demorei muito mais para entender o que tinha acontecido.

Percebi que tinha ido parar em hospital qualquer e que apenas me acompanhava um amigo. Percebi também umas dores pelo corpo, uma tonteira e foi tudo o que eu pude perceber.

Meu cérebro processava coisas que eu não tenho condição de lembrar, como a maioria das coisas ocorridas até aquele momento. Só sentia vontade de correr e sair daquele lugar, ir para qualquer lugar que fosse distante do meu conhecimento, mas meu corpo estava inerte.

Não havia músculo ou esqueleto que obedecesse aos comandos do meu cérebro. Isso me irritava muito.

Como não podia controlar o meu corpo, decidi fazer esforços maiores com o cérebro e procurei me situar no espaço e no tempo. Vasculhei por toda a memória e pouco conseguia ligar entre as coisas que haviam acontecido e aquilo, que é como eu prefiro chamar a situação.

Mais tarde descobri que aquilo fora o mais perto do nada que eu um dia pude experimentar. Foi o mais próximo que cheguei do que é nada. Inconsciência.

Por mais que eu tente me lembrar, é impossível saber como cheguei ali, como tudo aconteceu. Consigo apenas enxergar luzes.

Como é bom não lembrar, como é bom não sentir...
E estive inconsciente e descobri que isto é um estado que te faz não lembrar, não sentir, não querer, não precisar... É estar quase morto, o coma. É a melhor coisa da qual consigo me lembrar, exatamente porque é a parte da vida que, por mais que eu queria, não consigo acessar. Só existe a Luz.

domingo, 22 de novembro de 2009

O Sótão

Sua alma ardia e por isso a inquietação. Não havia lugar ou coisa qualquer que confortasse seu corpo, menos ainda a alma. Deitou, levantou; abriu a janela, fechou. Andava de um lado para o outro, desenhando com seus passos o chão.
Não encontrava canto na casa que não o expulsasse. Os rostos nos quadros o encaravam e mil vozes se confundiam nos seus ouvidos, na sua cabeça. O desespero tomava conta de todos os seus músculos, agora incontrolavelmente trêmulos.
Despiu-se ainda sem saber muito bem como chegar ao chuveiro. Quando o encontrou, fez despejar sobre si a água mais gelada para o banho. Sentiu a água lutar contra a brasa que ardia em seu peito. Urrou de dor e sentiu escorrer em seu rosto lágrimas quentes, misturadas agora ao jato de água fria que descia em seu corpo. Desciam juntas, agora.
Demorou-se ali, mas sentia ainda o ardor, a dor. Desistiu e, ainda nu, saiu pela casa, molhando o carpete e o piso taqueado. Andou em círculos e em uma dessas voltas escorregou na água que formava uma poça sobre o piso. Bateu a cabeça e, quando pôs-se de pé, sentiu tonteira e quase caiu novamente. Passada a vertigem, sentiu quente escorrer-lhe pela fronte o sangue que se precipitava pelo corte. Praguejou contra a própria burrice e continuou pela casa. Procurava algo. Vasculhava cada gaveta e cada canto nos armários. Estava ali em algum lugar.
De repente, um estalo:

- Claro. O sótão!

Caminhou com passos firmes, decididos. Inclinou a pequena escada em direção ao sótão e ali vasculhou ainda procurando. O calor do seu corpo já havia evaporado quase toda a água em sua superfície. Arranhou-se esbarrando algumas velharias no sótão até que por fim encontrou, no interior de uma caixa de madeira trabalhada, gravada com o nome de seu avô, homem forte, honrado, Oswaldo, a arma dos tempos de militar. Na mesma caixa ainda havia munições, escolheu três. Desceu pela escada, mais trêmulo; chorava. Adentrou a sala de estar, os retratos pareciam assistir a cena. Carregou o revólver lentamente. Suas mãos vacilantes seguravam o revólver e, antes de apontá-lo para a própria boca, respirou fundo e olhou ao redor. O ferro estava frio, morto. Hesitou ainda alguns segundos e sentiu com a língua o gosto da pólvora antes que pudesse sentir e a tensão de cada nervo sob a pele. Não tremia mais, nem nada. A sensação fria em sua boca agora tomava o corpo e tudo parecia ter congelado, tamanha a frieza. Só os o olhos ainda mexiam sob sua vontade.
As luzes se confundiam e tudo girava tão rápido que se fazia impossível entender qualquer imagem que tentava se formar em sua retina.
A última verdade despertava o maior medo. O medo fazia o suor escorrer frio. Tudo muito frio. A respiração ofegante de repente transpassada por um bafo insuportavelmente quente, simultâneo àquele ensurdecedor estampido e um clarão.
O revólver tombou para o lado ainda carregado de duas munições. Estava ainda quente, mas esfriariam, tanto o revólver como a carne posta ao lado.




segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Continuar

Se seus óculos fossem escuros, guardariam sua dor em um lugar seguro, onde você quisesse. Você é míope e está chovendo. A chuva é uma mentira em você, mas é seu único disfarce. Continue.
Eu não rio de tudo, mas tento não chorar. A saudade é boa, é muito boa. Mentindo ao dizer que as coisas não vão mudar, não precisa, é visível, mais agora, já mudaram. Tente enxergar o lado mais concreto do todo, os fragmentos desconexos serão espalhados pelo tempo e nada os trará novamente ao seguro.
Uma estrada cheia de curvas e as curvas escondem o que ficou para trás. Siga, se permita olhar no retrovisor, e então despeça-se.

O copo está meio cheio ou meio vazio? Ainda perto ou distante agora?

Não é difícil...


Desconcerto

A cada ônibus, um impulso fantasiado, um retraimento, uma confusão. Doeria? A quem doeria?

De noite, chuva no telhado, canções lentas, insônia e ânsia. Dói. Sim, dói.

Faz-se silêncio em toda parte, todos os outros cômodos da casa, mas o ruído é ensurdecedor e vem de dentro, do meu particular, onde parecia mais seguro, mais controlável. Não era, não era. Agora eu vejo que tudo que vem de dentro é muito mais incontrolável. A própria ânsia, a dor e a insegurança, o arrepio, o ruído... Um desconcerto interno (total).

No fim, é só mais uma daquelas noites que já está por terminar. Bem ou mal, tanto faz. Só tem de terminar. Quando terminar, terminará só, por enquanto. Uma pausa para respirar.

Vou descobrir agora, finalmente, para sempre, se dói.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Exceto no horário de pico

Hoje de manhã uma empresa de ônibus estava em greve. Dá pra imaginar as paradas de ônibus como estavam, não é? Um detalhe que muda tudo. As pessoas xingam, ficam olhando o relógio compulsivamente, fazem amizades e se atrasam, quando não desistem de ir para os seus compromissos.

Hoje, no começo da noite, uma avenida importante da cidade estava parcialmente obstruída. Com isso, mais pessoas nervosas, xingando, olhando o relógio... o filme se repete. O problema é que daquela vez o problema já não era por conta do ônibus. A empresa já havia voltado ao trabalho. Daquela vez o problema era a morte de uma pessoa.
Não sei dizer se foi suicídio mesmo, mas é provável, já que o corpo estava sob as janelas de um dos prédios da tal avenida.


Escutei de alguém:
"O cara provavelmente passou o dia pensando em fazer isso, escolheu bem o horário de pico?!"


Quanta sentimentalidade, não?

De mudança

Se houvesse como mudar, eu mudaria. Mudaria tudo, muitas vezes, em inúmeras combinações diferentes. Mudaria-me e mudaria o dia de hoje. Mudaria o botão do mouse que eu usei, mudaria a hora que acordei, as palavras que falei, os desenhos que inventei. Eu mudaria os filmes que eu escolhi, os poemas que li e escrevi. Eu mudaria as verdades que escondi, e as que revelei também. Eu mudaria as noites de Lua cheia e o significado que tiveram. Eu mudaria mesmo, mudaria tudo.

Tudo isto que eu não posso mudar não me deixa triste. Nada me deixa triste, agora. Alegre também não, mas não ser triste é menos mau. Lembrar me deixa triste, mas está definido que isso não se repetirá por muito tempo.

“Todo carnaval tem seu fim, e é o fim, e é o fim

Deixa eu brincar de ser feliz, deixa eu pintar o meu nariz”

Quer saber?

Ainda há o que mudar.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Reorganizando (haha)

Não que eu tenha alguma certeza, porque agora é que não a tenho mesmo. Certeza nenhuma de qualquer coisa. E, embora não haja certeza, bom mesmo é a segurança de estar alheio às surpresas. Pode parecer certeza, mas seguramente não é.

A incerteza não me proíbe de estar seguro com algo. Certeza, como eu já disse, eu realmente não tenho, mas estou seguro de uma única coisa que basta: Não vou me arrepender.

Não faz sentido, eu sei, não faz mesmo!

Eu estou seriamente decidido a não me arrepender. Decidido a organizar as idéias, quando sua ordem estiver bagunçada, remontar o quebra-cabeça sempre que me for necessário. Dessa vez não tem choro, não tem vela. O que está morto, enterro, bato a terra e volto a caminhar.



Hahaha...

Que triste!

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Festa da Boa Vizinhança


Passada a meia-noite, ainda entra pelas frestas da minha casa a música da festa na casa do vizinho. Não sei quando isso começou, mas eu gostaria de saber quando vai acabar.

Em outras circunstâncias a festa não me incomodaria, mas hoje não foi um dia bom.
Hoje acordei atrasado e com sono, fui privado do Sol e do céu que constituíam o dia agradável que se fez. Fiquei privado dele por uma boa causa, é bem verdade, mas não vou negar que a minha vontade foi, o dia todo, deitar na grama e fechar os olhos, sob o céu e o Sol.
Quando fui, de certa forma, posto em liberdade, corri o máximo que pude até chegar em casa. Tudo para assistir ao jogo que esperei a semana inteira. Cheguei no intervalo e tive duas péssimas notícias: Meu time estava perdendo e o goleiro do meu time havia sido expulso. O jogo era contra nosso rival e seria muito ruim se perdêssemos, com certeza teria alguém pra me zoar.
Acabou 2 a 2 e, pelo jogo que assisti, posso considerar isso um bom resultado.
Além disso, meu pai está doente, eu passei o dia pensando em saudade, desejando algo impossível, olhando o celular e tentando não dormir. Não acho justo meu vizinho deixar o som alto. Não hoje. Hoje tudo me irrita!

domingo, 1 de novembro de 2009

Um dia feliz, pra ninguém...


Não demorou a perceber que estava atrasado. As horas na cama não esgotaram seu cansaço e ali se deixou ficar mais tempo do que havia calculado, porém era tempo necessário. Tempo que lhe faria falta, com certeza, mas de que ele não se arrependeu por perder.

Nos últimos dias não havia gastado tantos minutos para si. Parou e pensou naquela semana que teria fim em algumas horas. Já nem lembrava como era ocupar o pensamento com coisas que não estivessem ligadas ao seu lado máquina. Naquele dia pensou.

Só então é que pôde perceber com calma que estava tudo diferente.

Naquela semana não houve reclamações, naquela semana foi dormir a hora que quis, ouviu as músicas que queria, no volume que lhe parecia justo, saiu com os amigos que teve vontade, comeu e bebeu o que quis. Naquela semana não se perguntou onde estava seu erro, naquela semana pra nada teve de se justificar, não precisou falar o que não queria, não teve de se forçar a nada.

Sentiu, sim, falta das chamadas não atendidas no celular e de encontrar a luz acesa ao abrir a porta. Teve de se acostumar a pegar a chave na portaria (no primeiro dia subiu direto e depois teve de voltar) e teve também a liberdade de mudar os canais o quanto quis.

Encontrava-se parado, sozinho na cama, pensando. Era sábado e hoje o expediente no trabalho duraria a metade dos demais dias da semana. Ia se atrasar, mas não se importou. Era um dia começando diferente e ele sabia exatamente tudo o que ia fazer. Se ia dar certo ou não, somente importaria a ele e mais ninguém. Ninguém.



Ouvindo:

Só por hoje - Detonautas Roque Clube

Pra Ninguém - Capital Inicial

sábado, 26 de setembro de 2009

Contagem

Era cedo, numa quarta-feira quente, o coletivo abarrotado e Lívia sentia-se incomodada com um gordo de meia idade que a empurrava para fora do assento. Ao final de cada nova curva, mais fora do banco se encontrava.
Impaciente, começou a também empurrar o homem para o lado. O homem, que percebera a hostilidade de Lívia, a encarava com plena insatisfação. Isto de nada importava a Lívia, que acreditava ser esta a solução: Irritar ao homem até que este se enchesse e partisse.
O homem sentindo-se desafiado, pareceu perceber a intenção da moça. Resmungou baixo, após um longo inspiro: “Mais um dia... mais um dia!”. Ao ouvir aquilo, Lívia pareceu despertar de uma noite mal dormida. “Menos um dia... menos um dia” pensou, então sorriu.

domingo, 13 de setembro de 2009

Intuição

Estava tão acostumado a desdenhar coisas de pouco valor material. Dessa vez desdenhei de uma bola daquelas ‘dente de leite’, que não custa mais que dois reais por aí.

Fazia nada em minha garagem, apenas andava de um lado para o outro. Não, eu não estava procurando algo, estava apenas andando mesmo. Eis que uma dessas bolas aparece na minha frente (não me lembro de ter visto antes alguma em minha casa). Não hesitei e decididamente imprimi um belo chute na pobre coitada. Foi um belo chute mesmo.

Nunca antes, em todos os meus dezessete anos de existência, me senti tão idiota por não escutar minha intuição. Eu estava atrasado para ir ao cursinho e tinha me aconselhado intimamente a sair logo de casa. Não escutei minha intuição e me demorei tempo suficiente para desdenhar aquela bola. Míope, nem me lembrei, ao menos, que estava com o óculos sobre o nariz antes de cometer aquela estupidez.

A bola acertou a parede e atravessou o ar de novo, só que desta vez em minha direção. Depois de a ter visto alguns centímetros distante do meu rosto, fechei os olhos como se fosse adiantar de algo. “Poof” e quando abri os olhos reconheci um mundo mais embaçado. Neste mundo havia dois pedaços de óculos no chão, bem perto, um corte no supercílio direito e uma bola saltitante saindo pela tangente.

Se sucederam, então, alguns dias sem enxergar a lousa, lamentos pelo meu óculos preferido, agora dividido em dois, e o desaparecimento da bola, que me ensinara a não mais desdenhar de coisas quase sem valor material e a ouvir mais a minha intuição.

domingo, 16 de agosto de 2009

Não bata a porta

Eu poderia estar pensando mais em mim, agora que você foi embora. Mas, como eu esperava, agora é que não posso mesmo afastar meus pensamentos de você. Nem por um só dia. Não que eu os quisesse manter em você, acho que é bem diferente disso, mas como eu já disse, eu não posso apontá-los noutra direção. Eu poderia estar feliz com o fim das cobranças, das brigas, das ironias, das provocações, das insinuações e de todo o mau resto. Só que eu sinto muito a falta de você e de todo o pacote.
Eu tenho pensado muito em você, desde aquele dia. É inevitável e eu já até me acostumei com essa idéia. O problema é que isso dói um pouco. E o pior é que o pouco que eu acabei de dizer é só um símbolo do significado que tem a dor. É eu acho que dói mais por saber a minha parcela de culpa.

Eu já disse que errei e disse que me arrependo pelo que esses erros fizeram com você. Eu já tentei mudar a concepção que formou a meu respeito. Infelizmente você se mostrou bastante inflexível e eu entendo.
Apesar de tudo, queria que aceitasse algumas diferenças nossas. Saiba que a sua insensibilidade fica insuportável quando começa a me acusar com suas bobagens. Eu odeio quando você diz que estou indiferente. Eu odeio quando insinua que eu não me preocupo com você e com o que sente, eu não lhe daria ouvidos, se não me preocupasse. PARE de apontar os meus erros como se eles fossem os únicos responsáveis da situação e, PIOR, como se eu já não os conhecesse muito bem.
Foi uma decisão de ambas as partes, ainda que pendesse mais do seu lado e há mais tempo também. Eu não esperava sair tão lesionado dessa pancada. Eu não esperava redigir essas linhas de desabafo.E sabe de uma coisa? Acho que esse foi o seu maior erro. Você decidiu que ia partir e me deixou escrever isso aqui.

Eu sei que não está sendo menos difícil para você, mas não vejo muitas alternativas.
Seria mais fácil se sumíssemos da vida um do outro, na verdade, mas receio que não seja possível. Pior que a impossibilidade da distância é eu não querer me distanciar. Eu sinto muito a sua falta. Falta do seu cheiro, da sua voz, do seu sorriso, das mão geladas, das mordidas doloridas, dos beliscões, das brigas e ainda mais falta da felicidade que isso tudo me trazia.
Eu me acostumei a estar sempre com você, de uma forma ou de outra. Me acostumei com os esforços pra te ver, fossem para te convencer a me encontrar, fossem para enfrentar os engarrafamentos, ônibus lotados, sono de sábado pela manhã, o que fosse preciso pra me encontrar com você. Me acostumei a ligar só pra dizer um ‘te amo’, ou pra saber se está tudo bem. Me acostumei a gostar de escolher e comprar botões de rosa vermelha. Me acostumei a ter você sempre como primeira coisa a se pensar. Você sabe o quanto isso é verdadeiro.

Tem sido desgastante conviver com tudo isso sem ter você por perto. Eu queria que você entendesse como pesa ter tudo isso e não ter o principal, não ter você. Não me julgue mais, eu não estou feliz como você pensa.
Se você vai mesmo, tente não fazer barulho ao abrir e fechar a porta. E quando sair, apague a Luz, pois eu não quero perceber tão logo a sua ausência.

Mudo

Quando deixamos passar alguma coisa que nos parece tão necessário dizer, dá uma sensação desconfortável de insatisfação. Parece que você está saindo pela porta dos fundos, ou que está fugindo de algo, ou fugindo de alguém.
Às vezes não se trata de fugir, exatamente, e sim evitar. Nem sempre aquilo que você deixa de falar, por mais que te faça mal guardar, teria melhor efeito dita. Trata-se, então, de manter-se distante de uma situação pior.
O pior mesmo é deixar de falar o que alguém poderia estar esperando ouvir de você. Uma conclusão, uma declaração, uma bronca, um sinal de preocupação, um pedido de desculpas... Esse é mesmo o pior. Nem sempre pelo mal que pode te fazer, mas a quem há de se decepcionar com o seu silêncio. É bem verdade que às vezes se espera muito mais do que o aquilo que podemos atender, mas algumas coisas são tão simples que não doeria dizer, e mesmo assim não são ditas.
Às vezes somos tão tagarelas, disparando tantas ofensas, tantas inverdades, tantas provocações e quando nos encontramos satisfeitos, nos esquecemos completamente de dizer o mais importante, o que não devia ser omitido: O nosso pedido sincero de desculpas. Por outras vezes, ainda, esquecemos de dizer o que nem precisa ser dito para que seja sabido, mas algo que pode fazer falta a quem não o ouve de você. Às vezes amamos tanto a alguém, que simplesmente esquecemos de revelar isso a este, por parecer óbvio, talvez, mas que, por fim, pode fazer falta. Não se trata de namorado ou namorada apenas, mas todos aqueles que te fazem sentir melhor. Aqueles a quem você queria dizer e não disse.
Às vezes deixamos de falar o que mais desejamos, ou o que mais precisamos, ou o que mais esperam, simplesmente, mas não somos conscientes do quão próximo ficamos de deixar passar a última chance. Às vezes o silêncio pode se prolongar por um tempo maior que aquele que desejamos.

sábado, 8 de agosto de 2009

Submersão


Cada centímetro do meu corpo doía de frio quando submergiu naquela água tão fria em que caí. Meu corpo parecia contorcer-se involuntária e violentamente em busca de algum sólido. Meus pés esticados tentavam tocar algo, ao mesmo tempo em que desordenadamente tentavam manter minha cabeça para fora da água.

Era desesperadora a tentativa tão vã de erguer-se dali. Mais difícil a cada segundo passado, pois todos os músculos foram-se cansando e desistindo de lutar.

Todo o esforço dificultava a respiração e o cansaço parecia algo a me puxar o corpo com muita força em direção ao fundo. Um fundo que eu não sabia estar tão longe e temia mesmo assim. Os pés que tentavam alcançá-lo, agora pareciam pedras de gelo e se contorciam em câimbras terríveis.

Toda a dificuldade em respirar fez com que algo quente se sobressaísse ainda a todas as sensações. Era vermelho e manchava alguma extensão de água e espuma que cercavam meu corpo frio, quase congelado. Ainda restava alguma força, portanto ainda rebatia os braços e tentava manter o rosto acima da superfície.

Não durou mais do que dez minutos. Foi um reboliço violento e gigantesco, mas era totalmente vão. Ainda foi possível sentir a água gelada percorrer toda as vias respiratórias antes de encher os pulmões e permitir-me a inconsciência. Fez-se, então, muito silêncio.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Sem despedidas


Saber-te tão longe foi a minha maior dor. Não me despedi como queria e quando menos esperava recebi uma notícia que, por mais difícil que tenha sido aceitar, cedo ou tarde eu sabia que viria. Foi a minha maior dor, meu choro mais desesperado, a indignação mais insuperável... Quando eu te perdi deixei que muita coisa fosse junto e eu nunca vou esquecer daqueles dias.
Você não sai da minha cabeça e eu só queria poder ter você mais algumas horas. Só queria que você estivesse ao meu lado pra me ouvir dizer o quanto eu te amo ainda. O quanto memórias me vem e me trazem o melhor de você. Eu queria só mais um dia com você e então fazer ter sido válida toda a espera, toda a angústia e saudade.
Ainda me lembro das cartas que te escrevi e do quanto eu me sentia bem ao entregá-las. Lembro-me das conversas e das suas palavras, palavras que eu não vou esquecer.
Eu te olhei e vi fragilidade onde não existia. Em você vivia o amor. Um amor louco pela vida e por isso você lutou tanto por viver.
Me lembro da dor que senti quando abandonei o elevador e ao girar na direção da porta azul, onde estavam as letras “U.T.I.”, vi sua cabeça esforçando a inclinar-se para ler alguma carta recebida há pouco, provavelmente de Bruno. Ali não havia mais como segurar o choro que eu tentava prender desde a véspera.
Atravessei a porta azul e fui ao seu encontro logo menos ter lavado as mãos, como orientara a enfermeira. Quando coloquei-me aos pés do leito senti um frio horrível na barriga, como se em meados do verão se desse um inverno rigoroso em meu estômago. Meus olhos, muito contrários ao estômago, estavam em brasa e cheios de lágrimas, prestes a romper em um choro que havia sido guardado com muito esforço.

- Não chora, Vi.

Foi só o que me disse para destruir todo o meu empenho até ali. Eu nunca havia vivido situação de qualquer ordem semelhante. Era a minha primeira vez e já tinha sido o bastante. Naquele momento poderíamos ter ido embora e jamais voltado àquela situação.
Mal sabia eu que aquela era a primeira vez, mas que ainda viriam outras visitas. Mal sabia eu que não te ver diariamente, ainda que plantada sobre aquela cama, mesmo que pelo insuficiente tempo de 15 minutos, seria a única forma de obter algum alívio.
Fato é que os dias em casa não passavam e a ânsia por notícias era azorragante. Os próximos 52 dias foram amargos demais. Impaciente não via a hora de ir visitá-la, mas isso se tornava cada vez mais raro.
Nosso drama começou no dias 2 e 3 de Dezembro daquele ano. Nosso último ano estudando juntos. Nosso último ano naquela escola. Pouco antes, no primeiro dia de dezembro, fomos ao parque, brincamos, nos divertimos. Todos juntos, nem imaginávamos como aquele dia nos ficaria parecendo uma despedida, mais tarde.
Ainda antes do Natal foi quando eu conversei pela última vez com você. Quando te vi depois disso, estava induzida em coma e reagia a poucos estímulos. Ligada a diversos aparelhos, dreno e eletrodos, resistiu até o dia 24 de Janeiro, quando por fim, sem despedidas faleceu.
Era quase véspera do meu aniversário e foi muito difícil entender que você jamais o comemoraria comigo novamente. A pior dor.
Às vezes a saudade me assola de maneira sufocante. Eu ainda tenho as cartas que não pude te entregar (guardarei para sempre) e às vezes ainda sonho com você. A dor que mais dói, Cassia, é a saudade que eu tenho de você. Uma dor incurável.
Muita saudade!

Sedado


Uma vez eu te disse que queria ser sedado. Acho que não te conhecia direito, pois me surpreendi ao ouvir que também você queria. No dia falamos um pouco sobre isso, mas eu nunca pude ilustrar a minha vontade e acho que você nunca a entendeu.
Seria um alívio ao peito, um descanso à cabeça, um silêncio profundo e uma serenidade absoluta em mim. Seria um banho de água fria em minha impaciência. Nessa minha ansiedade em viver a vida que não posso saber.
Queria por fim ao meu ímpeto de testar e conhecer, observar e sentir. Tudo de uma só vez. Um saco. Uma impaciência sem limites que não me deixa em absoluto repouso tempo algum.
Sinto-me preso. Realmente preso a essa ansiedade desesperadora. Que me parece a cada dia mais devoradora.
Queria um remédio que me acalmasse e me pusesse e sono profundo. Que me libertasse de tudo o que não detenho e ainda me traz a violenta necessidade de cumprir com os tratos que não me fiz, mas que aceitei por gosto.

Das nove


Quando nossas bundas esquentam as poltronas que nos separam do chão e nos guardam o melhor lugar em frente à televisão, qualquer força empenhada para erguer-nos dali é incômoda. É natural que o conforto e calor do estofado nos mantenham fiéis o maior espaço de tempo possível e saudosos quando distantes. Inertes, somos incapazes, muitas vezes, de abalar nosso comodismo, mesmo sabendo quão bem isso poderia nos trazer. É assim que nos tornamos revolucionários domésticos.
Comodamente colocados ante o televisor, captamos atentamente aos informes arremessados em brasa em nossas direções. É estabelecida a ligação direta entre a informação e nossa (in) consciência. Nos revoltamos e maldizemos os vilões expostos. Indignados, prometemos a nós mesmos realizar vingança. Enfim, aceitamos que algo deve ser feito.
Estamos agora plenamente insatisfeitos com a realidade e absolutamente comprometidos a mudar em definitivo.
É lamentável, porém, que em poucos minutos nossa consciência já tenha se vinculado a outra causa nobre, talvez maior que a anterior, por que não? É muito difícil pensar na realidade que se vive quando há afeto maior à causa da mocinha da novela.
Mas a culpa não é nossa, afinal a telenovela vem logo após o telejornal e mais tarde já é a hora de ir para a cama.
Dormir é o melhor remédio para esquecer.

Sufoco


Era um pedaço de papel, mas eu não o via. Era mais do que branco, ou da cor que ele fosse. Era um pedaço de papel que me incomodava enormemente, me paralisava. Ele não foi prudente, me desafiava, me tocava, me intrigava, me enlouquecia e continuava a ser um pedaço de papel. Maldito pedaço de papel.
Era um pedaço de papel que me amarrava qual camisa de força. Não escapava, não podia me livrar custasse todo o meu esforço. Ele estava ali, me estrangulando indiferentemente. Não vibrava nem ressentia, me esmagava sem qualquer gesto. Aquele pedaço de papel me consumia livremente.
Não me doía mais. Não sabia o motivo pelo qual me rebelava diante a um pedaço de papel, mas estava descontrolado.
Não via saída, era matar ou morrer. Um pedaço de papel ganhava a batalha e isso me enfurecia. Fui cegamente guiado pelo desespero. Prendia a respiração, aflito, e não pude evitar: Enchi-o com minha caligrafia, feroz e imponente, sem temores. Só assim retomei minha liberdade.

sábado, 25 de julho de 2009

Alguém

São perfeitos os dias claros, azuis e límpidos, se você tem alguém que vai deitar sob o céu com você, a fitá-lo. São perfeitos os dias escuros, cinza e nebulosos, se você tem alguém que vai dividir um cobertor e assistir (ou não) um filme com você.Quando se tem alguém, é normal prestar atenção na previsão do tempo só para saber o programa ideal.
Quando se tem alguém, não faz diferença o dogão da esquina ou aquele restaurante que você tem até que cortar as unhas dos pés para entrar. Um pastel oleoso ou um sushi, pouco importa. Quando se tem alguém só importa é estar com esse alguém.
Você toma banho, escolhe a melhor roupa, e a melhor a cueca, o melhor calçado. Escova os dentes três vezes, passa fio dental, sorri na frente do espelho a cada três minutos até sair de casa, só pra checar. Passa perfume até no cabelo, confere o hálito, os bolsos, os dentes e finalmente sai. Olha duas ou três vezes para a lojinha de doces na frente do ponto, vai até lá, compra uns chicletes de menta e volta para o ponto. Quando se tem alguém, nada pode dar errado.
Isso faz de cada passeio uma nova missão. E é sempre a melhor sensação quando no lugar combinado, depois de esperá-la por alguns quarenta minutos, encontrar de novo aquele alguém. Não importa o resto do encontro: Por esse momento, toda a ansiedade até ali já valeu. Não poderia ser melhor.

Som ambiente

A música é uma linguagem universal, teoricamente respeitada e utilizada em todos os quatro cantos do mundo. A música pode perdurar por longos anos, atravessando ainda muitas gerações. A música é seguramente a expressão artística mais distribuída pelo planeta.
Hoje a música pode ser muito facilmente acessada em computadores, aparelhos de som, televisão, eventos, etc. Isso é um fato maravilhoso, afinal todos temos uma ‘trilha sonora’, não é? Uma música para cada momento, cada lugar ou ainda para cada lembrança.
Contudo essa acessibilidade e transportabilidade da música passam a ser um problema para muita gente quando combinadas com a falta de educação de algumas pessoas. Está lá, bem visível em cada coletivo regulamentado na cidade de São Paulo, o aviso: “É proibido o uso de aparelhos sonoros. Lei municipal nº 6681/65”, mesmo assim quem desfruta diariamente de um agradabilíssimo tour a bordo de um coletivo pela cidade de São Paulo já foi obrigado a compartilhar do gosto musical de alguém que, talvez por não saber ler, ligou seu belíssimo aparelho celular, ou mp3, mp4, mp5, (...), ou mpn no auto falante.
Pobres daqueles que, como eu, devido a invencível durabilidade de seus (não) fones-de-ouvido, se vêem forçados a se entregar ao gosto musical dos não educados.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Aprendizagem

Quando a gente recebe um choque colocando o dedo na tomada, aprende que não é todo buraco que podemos ir enfiando o dedo. Quando nos queimamos ao tocar o ferro de passar, se sozinhos com ele enquanto a mãe foi atender ao telefone ou coisa assim, aprendemos a nos manter distantes daquela parte metálica tão quente. Quando brincamos de correr e caímos feio por pisar no cadarço desamarrado, aprendemos a amarrar bem firme, com dois laços até. Acho que o aprendizado é um processo doloroso e por vezes até violento.
Sempre dizem que é errando que se aprende. Acho isso um pouco confuso. É estranho pensar que temos de nos ferrar antes de fazer algo como deve ser realmente feito e que só assim aprendemos. É estranho e é triste também.
Se temos de errar e nos ferir toda vez que precisamos aprender algo, é masoquismo da nossa parte, então, persistir no erro? Por que levamos tanto tempo para aprender certas coisas?

Tem coisas que deveríamos nascer sabendo.

Estranha necessidade

É estranha essa necessidade de se entregar. É estranho se procurar em outra pessoa. Essa ideia de que é melhor estar com alguém, se doar, fazer de tudo, suar a camisa para demonstrar a felicidade que aquela companhia te traz. É uma carência mesmo. Uma carência estranha. Um jeito estranho de se sentir bem.
Às vezes a pessoa passa a se entregar de espontânea vontade e nem percebe quando passa a ser mais do outro do dele próprio. E não há como dizer se é certo ou errado: Às vezes o cara se sente tão bem assim que é incapaz de considerar o risco que corre de se perder. Quando percebe, é tarde.
Não há luta. Se entregar é sempre uma boa sensação no começo, não há como recusar esse prazer. Não há como ignorar a vida que parece pulsar mais intensa no despertar de uma entrega. Contudo, perigosa, essa busca por se entregar pode acabar arrebentando aquele que vai muito além das linhas de segurança. Nem sempre você recebe algo em troca, quase sempre por não querer algo em troca. Dar muito mais do que receber é uma característica fiel dessa pessoa. É difícil saber onde pisa.
Descobrir que se ensartou em uma cilada, que se enterrou em um buraco cujo foi o responsável pela escavação, que laçou o próprio pescoço, enfim, é uma grande insatisfação. Então se passa a condenar o ideal criado de perfeição. Descobre que grande parte do colorido da história foi pintado à mão, e pela própria mão. Decepção, finalmente.
É necessário que haja equilíbrio. É preciso saber onde pisa e quanto ainda a corda pode aguentar.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Reconstruir

Não costumamos estar preparados para qualquer tipo de reforma ou demolição. Seguimos sem mudar a rotina por horas, dias, meses, enfim. Nunca contamos com imprevistos, situações que nos colocam pra fora de nossas próprias casas, inseguros, tentando pensar depressa e logo se reestabelecer.

Às vezes nos sentimos livres e seguros por mantermos tudo sob o nosso comando, debaixo de nossos narizes e ao alcance de nossas mãos. É assim que vemos perfeição. Preferimos uma segurança monótona a um desequilíbrio inconstante e "aventuroso" de situações.

Mas é impossível deter o controle de tudo o que nos poder, quer e deve atingir. Nossas casas pertencem sempre a lugar qualquer. Nenhum lugar é de nossas casas apenas. Nada que acontece a algum vizinho deixará certamente de nos acontecer, muito embora seja difícil de prever.

É assim que vemos nossas tranquilidades destruídas. Quando percebemos que o incerto nos atingiu, ou pode atingir, corremos confusos em qualquer direção, calculando e refletindo, buscando o antigo descanso a que podemos desfrutar quando temos as rédeas dos ocorrentes em mãos.

Sendo assim, cuidamos sempre em reconstruir nossas casas, por dentro ou por fora, mas de alguma maneira a conhecer cada cm³ dali.